terça-feira, 19 de junho de 2018

Flagrantes

Fulana vive compartilhando mensagens sobre fé, otimismo, ética, moralidade e religião, mas no emaranhado das redes sociais, acha bonita a homenagem que alguém faz a um ídolo do esporte e não hesita sequer um instante em copiar, colar e postá-la na sua própria linha do tempo assumindo o pequeno texto como se fosse seu.

Beltrano acha bastante criativa a frase de alguém acerca da conjuntura política do país e a sapeca na sua timeline sem mencionar o nome daquela pessoa que a havia escrito. Não é raro vê-lo agindo assim.

Sicrana apropria-se das fotos de um conhecido fotógrafo profissional, corta-lhes as logomarcas e leva aqueles retratos tão cheios da subjetividade alheia a público como se fossem seus.

Um canal de notícias – vejam vocês – copia fotos e texto do mural de alguém e os disponibiliza em sua própria página sem dar crédito nem àquele que redigiu o texto nem ao que clicou as imagens.

Todos recebem e acolhem naturalmente elogios por suas publicações sem que aproveitem a ocasião para citar os seus verdadeiros autores, para desfazer o que poderia ser somente um equívoco ou mesmo fruto de um esquecimento. Nesse exato momento, está escancarada a má fé.

Esses são todos fatos reais que pude contemplar num curto período de tempo nessa imensa passarela chamada Facebook, sem que fosse preciso para isso realizar qualquer tipo de busca ou de pesquisa.

Curiosamente, todos os que agiram desse modo têm algo em comum: divulgam matérias, frases, imagens, memes e coisa e tal criticando a falta de ética na política, na administração pública, no Brasil. Contudo, no afã de conquistarem alguma popularidade, de saírem bem no “face”, de fazerem graça, de publicarem algo belo e criativo ou seja lá o que for, fazem uma espécie de selfie de suas atitudes numa pose sem qualquer glamour e revelam que, no miudinho da vida, não foram nem tão honestos nem tão éticos quanto gostariam que todos fossem. As redes sociais são mesmo feito um espelho do que vivemos em sociedade e muitas vezes revelam exatamente aquele ângulo que se quer ocultar.

Não é por acaso que mais e mais empresas passaram a usar as redes sociais para a avaliação do perfil de seus funcionários e daqueles que se candidatam a vagas de emprego. No terreno da informalidade, não é difícil identificar inconsistências entre o que diz um currículo e a prática do indivíduo em sociedade. Entre plágios, tretas, indiretas, alfinetadas e recomendações, a dissonância entre o discurso e a conduta cresce, aparece e desvela o dono do perfil. Ditar regras é bem mais fácil do que se esmerar em cumpri-las.

Não dá para esperar que caia do céu um mundo cheio de honestidade e de ética. É a sociedade que faz do mundo o que ele é. E somos nós que constituímos a sociedade. É o somatório de uma porção das nossas pequenas (ou grandes) atitudes que tece a trama do mundo. Somos todos fios integrantes desse imenso tecido. O Brasil, a vida, as relações sociais e interpessoais precisam urgentemente de discursos mais afinados com a prática. É preciso calibrar nosso diapasão.

A mudança de conduta para a construção de relações e de lugares melhores precisa começar do individual para o coletivo e pode/deve ter início a partir de gestos muito simples, como, por exemplo, dar o devido crédito a quem o tem numa singela postagem nas redes sociais. É fácil, indolor, honesto e muito elegante.

A ética está ao alcance de nossas mãos, é bom que aprendamos a usá-la sem moderação.

(Publicado no Diário de Petrópolis em 29/08/2018)




OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
Imagem retirada do site:
https://bhdicas.com/afinal-o-que-e-etica
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domingo, 17 de junho de 2018

Salve a liberdade de escolha!

Jardim do Palácio Quitandinha
Até pouco antes do jogo de estreia do Brasil na Copa da Rússia, eu não tinha decidido se iria ou não assistir à partida. E muita gente pode não acreditar, mas sequer sabia o horário da disputa. Não que vivesse qualquer dilema por conta disso, apenas não via nenhuma urgência em tomar uma decisão. Tinha marcado um forrozinho esperto com meu pai para aproveitarmos o início da tarde cantando e dançando. Mantivemos a programação. 
Até então, vinha acompanhando as manifestações de torcedores e não torcedores da seleção Canarinho, sem achar que sim nem que não, mas que cada um tem a sua maneira de reagir a um mesmo evento e à situação em que se encontra o país. Continuo achando isso. Pelo menos nesse sentido, ainda é possível o exercício da liberdade.
Mas foi olhar o Quitandinha assim todo decorado, preparadíssimo, um luxo mesmo para receber os torcedores, que o clima da Copa chegou pra mim. Saímos do forró, que por sinal foi maravilhoso - eta, grupo porreta o tal do Ziriguidó! - correndo pra casa para acompanhar com a família o jogo do Brasil.

Jardim do Palácio Quitandinha decorado para a Copa

O time não venceu, mas ganhamos o dia. Assistimos ao jogo juntos rindo, brincando, torcendo, comentando, arrancando os cabelos com as oportunidades de gol perdidas, bem como com as injustiças da arbitragem e passamos um bom pedaço da tarde em plena curtição.

Falava com uma amiga dia desses, que todos nós merecemos "um descanso na loucura" e que de amor, paixão e alegria, estamos todos precisados. Assim nos diziam Guimarães Rosa e Drummond, com alguma diferença, é claro. Hoje o futebol me salvou do absurdo e de tudo mais que estamos presenciando. Vivi uma hora e meia de recreio e quero mais. Nas horas restantes, eu penso em coisa séria. 

terça-feira, 12 de junho de 2018

Retrato

O menino passa com sua caixa de sapatos
pedindo uns trocados em plena 16 de março
engulo as lágrimas
calo o choro
tenho a boca seca
e a alma encharcada de pranto.

Ouço a moça sentada na calçada na porta 
do mercado da Marechal Deodoro,
com o filho mal agasalhado nos braços,
a murmurar-me um pedido de frutas
para adoçar a boca (ou aquecer a alma?)
do rebento.
Nego, sigo, empaco.
O murmúrio nos olhos daquela mulher
me fez olhar para trás.
Flagro uma senhora
(quem sabe a mãe da moça)
devorando uma espécie de tangerina,
ainda meio envolta em cascas.
A cena é dura
a fome com que come corta-me.
Volto.

A jovem com o filho nos braços
e com olhos súplices me encara.
Cruzamos olhares, trocamos falas:
- Que frutas seu filho come?
Dou-lhes uma porção das escolhidas
que, sei, não matará suas fomes 
- plurais -
apenas por hoje, quem sabe amanhã ainda
tornará suas vidas um pouco mais palatáveis.
A Criança dorme
a Senhora fita-me
a Moça me doou um sorriso:
alimentou-me.
Prossigo.

Pelo caminho, meus olhos sangram
desse, às vezes, sangue sem cor
que vertemos de tristeza.
Preciso café
expresso pequeno e forte
enquanto enxugo o pranto.
Sigo.

Passo pela Praça Paulo Carneiro.
Onde antes havia caminhas para cachorros,
há uma fina manta cor de rosa estendida no chão:
um Homem dorme.
As camas dos cachorros já não há
um Homem dorme no canto da praça
desamparado até pelos cachorros
que estão juntos se aquecendo
ao centro dela.
Havíamos dado cobertor às gentes
e começávamos a ajudar os bichos.
Que retrocesso!

Engulo seco
não dá mais pra não notar
a Fome, o Medo e o Desamparo
estão berrando em vias públicas
de cidades, de estados, do país.

Levei um soco
era domingo
hoje é terça
e a Dor não passa.

sábado, 9 de junho de 2018

Lindos e graciosos

Surya Trio
E como se o destino quisesse iluminar ainda mais a serra, uniu três músicos pródigos de carisma e talento e lhes deu a sentença: "Vai, Surya, vai ser luz nesta vida!" E o trio não só aceitou, como honrou o veredicto. Surya é Sol, é Luz, é a música nos dando um sorriso. É emoção à flor da pele e puro encantamento.
Foi a sensibilidade de Guilherme Mará que deu início ao grupo. Tendo sido convidado para tocar em um evento em Petrópolis, Mará avaliou que o lugar pedia a junção ousada de sanfona, violino, cello e pandeiro e não perdeu tempo: convidou Frida Maurine e Yuri Garrido para a ocasião. Sob as bênçãos do acaso e da sensibilidade nascia o Surya Trio.
No último domingo, o grupo se apresentou nos jardins do SESC Quitandinha e aqueceu a manhã fria e cinzenta à beira do lago. Foi tudo som. Foi tudo cor. Com um delicioso e variado repertório que foi de Chiquinha Gonzaga a Dominguinhos e Nando Cordel, o trio iluminou o dia e encantou o público presente.

Segue uma pequena mostra daquela manhã em um videozinho amador para lhes abrir o apetite. Iluminem-se!
Surya Trio
Guilherme Mara - Sanfona/Cello
Yuri Garrido - Percussão
Frida Maurine - Violino