Poucas coisas fazem a gente se
sentir tão mal como ser ludibriado, enganado, passado para trás (é tão
irritante que dá vontade de ir se referindo à vilania de todas as formas). Dá
vontade de não pensar mais no assunto e de não falar sobre isso com ninguém.
Entretanto, uma parte importante daquilo de que os vilões se alimentam
denomina-se silêncio. É o silêncio das vítimas, que colabora para que eles
sejam cada vez mais eficazes em seus golpes.
Até as pessoas que me conhecem
minimamente sabem que uma de minhas
paixões é a cidade do Rio de Janeiro. A despeito de todas as críticas que são
feitas a ela, meu amor pelo Rio é incondicional. Mas dotado de uma boa dose de
realidade, não finjo que o lugar não tem problemas. Ontem, eu e quatro de minhas amigas fomos à Cidade Maravilhosa para degustar as delícias
da exposição de Dali e daquela bossa irresistível que só o Rio Antigo tem.
Chegamos na hora certa, visitamos a mostra confortavelmente, revivemos a
história, respiramos cultura. Haja variedade em apenas um quarteirão: de Dali à
feira livre! Um banquete para todos os sentidos. Até então, um sensacional
programinha de sábado para pessoas que curtem estar juntas.
Depois do almoço, como havíamos
programado de seguir para o Leme, fomos apanhar o carro para continuar o
passeio. Foi, então, que tivemos uma ingrata surpresa: havíamos sido autuadas.
O carro, parado em local indevido e eu, a condutora, de repente atordoada a me
perguntar: mas se era tão óbvio, como pude parar aqui?
Refazendo o percurso: chegamos à
Candelária, tivemos a preocupação de parar o carro em um local adequado,
procuramos informações com motoristas profissionais (em seu ponto de embarque
de passageiros) e fomos orientadas a seguir pela Presidente Vargas. Num piscar
de olhos salta um “flanelinha” à nossa frente e começa a nos direcionar para o
pseudoestacionamento. Cobra de nós um valor pelo “serviço” e nós seguimos em
paz para nosso programinha cultural. Tudo parece tão normal, que embarcamos na
malandragem e deixamos de perceber os sinais claros de que ali, era óbvio que
não poderia ser um estacionamento. A constatação de que o estacionamento não
existia fez-me vivenciar o SURREALISMO em toda a sua dimensão. O chão faltou
sob os meus pés. Eu, verdadeiramente, senti-me tola, ingênua, incauta e uma
série de outros adjetivos de campo semântico semelhante.
Conversando com comerciantes do local,
soubemos que essa é uma prática comum, que funciona assim o tempo todo, entretanto
que, durante a semana, a fiscalização não passa e tampouco autua os veículos
estacionados. As autuações são feitas somente aos sábados, quando a maioria dos
“incautos” é composta por turistas. Concluo que, se os relatos dos comerciantes
forem verdadeiros, o poder público,
nesse casso, seria omisso e agiria de má fé. E me ocorrem vários
questionamentos: Se o problema é conhecido, por que permitirem a atuação de
“flanelinhas” nesse lugar? Se as multas são comuns, por que não montar um
serviço de proteção que alerte os turistas na região? O local é uma “fábrica de
multas” que gera receita para o município (havia, somente no local em que
estávamos, talvez uns oito veículos
autuados)?!?!
Como pessoa, senti-me ingênua,
como turista desprotegida, como cidadã desrespeitada. E o passeio, que até ali seguira
perfeito, perdeu um bocadinho de seu brilho. Salvaram a mim e as minhas amigas,
uma volta pela orla de Copacabana e Ipanema e o bom senso de uma de nós que
colocou um sambinha irresistível pra tocar: “...o Rio de Janeiro continua
lindo...”. Concluo: continua, mas precisa repensar a sua administração.
Escrevo para que outras pessoas
possam ter conhecimento do fato e que, dessa maneira, não caiam na mesma
cilada.