Petrópolis, 16 de março de 2018.
Cara Marielle.
Foto disponível no Facebook de Marielle |
Infelizmente, você nasceu na
minha vida no mesmo dia em que partiu deste mundo tão complexo e complicado em
que vivemos. É verdade, eu não a conhecia e tampouco tinha ideia de seu
trabalho, luta e história tão cheios de significado. Diante da repercussão de sua morte,
fui procurar entender quem era você para começar a pensar com alguma lógica em
quem poderia ter interesse em calar a sua voz.
Fiquei muito bem impressionada ao ir vendo o desenho de sua trajetória e também ao descobrir que você representava tudo aquilo de bom que se defende em matéria de política e de vida em sociedade: ética, respeito, liberdade, igualdade e o pleno exercício da cidadania. Adorei saber que a moça que gostava de estudar e que concluiu a faculdade na PUC Rio não veio a este mundo para brincar, ainda que de modo alegre – como relatam seus amigos - e sempre trajada com cores vibrantes, tivesse constantemente um sorriso pra distribuir. Encontrei na sua voz pensamentos bem próximos daqueles que costumo defender. Por certo, não concordamos em tudo. Temos pontos de divergência e isso é sempre bom.
Ontem, quando me aproximava da Lapa, ainda sem saber a totalidade do pouco que sei hoje a seu respeito, meu coração doeu e o choro foi inevitável. Dor e choro porque uma mulher idealista e cheia de garra havia sido morta por defender e lutar por seus sonhos e ideais. Uma moça linda, cheia de vida, que teve a rota interrompida ainda no início do caminho. Essa sensação de saída antes do tempo. Essa constatação de saída forçada e brutal. Esse confronto com a finitude planejada, com o desejo de extermínio. Tudo isso me fez/faz sangrar.
Fiquei muito bem impressionada ao ir vendo o desenho de sua trajetória e também ao descobrir que você representava tudo aquilo de bom que se defende em matéria de política e de vida em sociedade: ética, respeito, liberdade, igualdade e o pleno exercício da cidadania. Adorei saber que a moça que gostava de estudar e que concluiu a faculdade na PUC Rio não veio a este mundo para brincar, ainda que de modo alegre – como relatam seus amigos - e sempre trajada com cores vibrantes, tivesse constantemente um sorriso pra distribuir. Encontrei na sua voz pensamentos bem próximos daqueles que costumo defender. Por certo, não concordamos em tudo. Temos pontos de divergência e isso é sempre bom.
Ontem, quando me aproximava da Lapa, ainda sem saber a totalidade do pouco que sei hoje a seu respeito, meu coração doeu e o choro foi inevitável. Dor e choro porque uma mulher idealista e cheia de garra havia sido morta por defender e lutar por seus sonhos e ideais. Uma moça linda, cheia de vida, que teve a rota interrompida ainda no início do caminho. Essa sensação de saída antes do tempo. Essa constatação de saída forçada e brutal. Esse confronto com a finitude planejada, com o desejo de extermínio. Tudo isso me fez/faz sangrar.
De volta a minha cidade, mais
leituras sobre você, mais vídeos assistidos, mais vezes ouvindo a sua voz, a
sua fala, um pouco mais de você para tentar entender o porquê de, ao que parece, quererem fazer cessar sua atividade política. Conforme
os detalhes do crime iam sendo revelados, eu ia pensando no tipo de pessoa que a
matou. Em seu carro havia outras pessoas além de você. Eram vidas que, pela
forma com que os disparos foram efetuados, não tinham nenhuma importância para
o assassino. Anderson, seu motorista, foi morto por estar na mesma linha de
tiro que você e nada mais. Para o seu assassino, a morte desse homem jovem,
trabalhador, pai, amigo e esposo, pode ter sido apenas um dano colateral. Tudo indica que nada foi feito para que a morte dele pudesse ser evitada. E isso me choca ainda
mais. A sua não conformidade foi defender a liberdade, as minorias, os Direitos
Humanos, tão fundamentais para cada um de nós. Tudo leva a crer que, para o atirador, Anderson não tinha qualquer significado, era apenas alguém que estava no
caminho das balas. Como pode uma vida a mais ou a menos não importar para
alguém?!
Foto de Thaís Alvarenga em 08.03.2018 |
O Brasil que você deixou continua
a mesma praça polarizada dos últimos tempos, mas não é o mesmo. A sua morte
disparou um gatilho de luta e de resistência naqueles que se negam a sucumbir
ao medo. A Cinelândia foi tomada por uma manifestação pacífica e transformada num
espaço para gritar o seu nome. Para convocar e proclamar a sua presença, apesar
da sua morte física. O nome de Anderson também ecoou pelas ruas. Foi
emocionante!
Desde quarta à noite, tem sido
difícil estar nas redes sociais. Tem sido doloroso ver a dureza das palavras
dirigidas a você e a seus companheiros de luta. Tem sido repugnante ver o ódio
materializado nas telas. O que são as palavras se não a materialização do pensamento?
E os pensamentos expressos, creia, são os piores possíveis. Parafraseando
Renato Russo, nos deram o ‘face’ e vimos um Brasil/um mundo doente.
Quando o Brasil perdeu de 7 a 1
para a Alemanha e o brasileiro foi obrigado a entender que existe mais coisa
aqui na terra do que o pretenso talento inigualável do jogador brasileiro de futebol, cheguei a ficar animada que o assunto central das conversas agora
fosse a política. Passado algum tempo, percebi mais do que a modificação da
pauta dos bate-papos. A paixão agressiva e imatura pelos clubes havia sido
transferida para partidos políticos. Algumas discussões na internet lembram
bastante as falas de torcedores inconsequentes que não se importam em quebrar
um estádio ou um país, desde que o time deles saia ganhando. As redes sociais, que
não por acaso têm esse nome, já que são um veículo que ligam diferentes linhas
que se cruzam em determinados pontos e formam um conjunto capaz de salvar,
capturar ou aprisionar (uma rede serve para esses fins, não?!), foram invadidas
por uma horda de torcedores de um Fla X Flu apocalíptico, em que o bom senso e
o equilíbrio foram expulsos de campo. São torcedores inflamados ofendendo o oponente,
fazendo apologia ao crime de morte, à lei de talião, ao quebra-mata-esfola, e berrando
“morreu porque mereceu” ou um infantilizado e cruel “bem feito”. É tanta gente
em algazarra pregando os absurdos mais impiedosos sem qualquer constrangimento,
sem qualquer autocrítica ou autocensura, que chego a duvidar que a sociedade
brasileira consiga trilhar um caminho acertado algum dia.
Que tipo de doença será que faz
uma pessoa pensar em um ranking de mortos, como se houvesse um morto mais
importante do que outro? Cada vida perdida é uma lástima! Estão categorizando
os mortos, Marielle! E reivindicando o impossível: que todas as mortes
ocorridas no Estado do Rio de Janeiro tenham a mesma visibilidade que a sua. Como
se não soubessem que a maioria esmagadora de nós não teria mesmo tal
visibilidade. O motivo da visibilidade no seu caso é tão óbvio que me dá um
pouco de má vontade de ponderar. Basta lembrar que você ocupava um cargo que
representava o voto de mais de 46.000 pessoas e que era porta-voz de uma luta
inteira. As pessoas agem como se fosse a visibilidade da morte de cada um que
importasse. Não é! O que importa é a morte de cada um deles! O que importa, diante
da impossibilidade de que você e eles voltem à vida, é fazer dessa sua morte um ponto de partida
para que se obtenha justiça para a sua família e para as famílias dos mortos do
Rio e de tantas outras localidades. É unir as lutas e não separá-las. É somar e
não dividir. É lutar por uma modificação dessa justiça aí constituída (ou da
falta dela), dessa segurança aí posta (ou não), dessa dura realidade que
estamos enfrentando. Importa transformar essa tragédia no mote para o fim do
faroeste estabelecido na capital fluminense e em tantos outros lugares Brasil afora.
Todos sabem, alguns apenas não
querem admitir, que a sua morte não foi aleatória, ligada exclusivamente às
questões inerentes à área de Segurança Pública do Rio de Janeiro. A principal linha de investigação
da polícia, desde o primeiro momento, é de que ela tenha sido uma execução. As
balas que a atingiram tinham endereço certo, queriam exterminá-la. Não foram
fruto de uma tentativa de assalto mal sucedida, tampouco estavam perdidas,
muito pelo contrário. Quatro balas na cabeça! Quando se morre pelas ideias que
se defende, isso tem um significado ainda mais ampliado.
Tem sido muito doloroso ver junto
ao seu corpo e aos corpos de tantas outras pessoas assassinadas no Rio, a
esperança, a empatia, a solidariedade e, sobretudo, a humanidade em franca
agonia. Os tiros são muitos, Marielle. A sociedade brasileira tem se
desumanizado e isso ficou ainda mais evidente nesses últimos dias.
Marielle, presente!
Anderson, presente!
Hoje e sempre!