sábado, 27 de outubro de 2018

O Brasil está um país bipolar


A mim me custa ver a cegueira que acomete a justiça brasileira. Não pelo fato da imparcialidade, o que justificaria a venda nos olhos, embora não justificasse cegueira, já que há muitas maneiras de ler o mundo, mas pelo fato de ela ainda não ter percebido/lido/entendido que, se as instituições estão fortes e se esse discurso de ódio não atinge a justiça e os magistrados, ele atinge em cheio a população do país.
Imagem disponível no Pisabay
A justiça brasileira ainda não viu que uma parte imensa da população está absolutamente dividida entre a depressão/ansiedade e a euforia. Uma parte está horrorizada com o discurso de ódio proferido pelo candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro e outra parte está eufórica pelo mesmo motivo e, por isso, tem extrapolado em medida muita os limites da educação e da razoabilidade. A todo o momento, os consultórios de psicologia têm recebido pacientes deprimidos, ansiosos, apáticos, abatidos.
Há, ainda, outras partes do todo brasileiro que não se encaixam na majoritária bipolaridade. Aqueles que estão vendo a grave situação por que passa o Brasil, que percebem os efeitos negativos daquilo que se aproxima, que notam e que também sentem o impacto violento da onda de ódio em que quase a totalidade da população está mergulhada, não estão deprimidos nem eufóricos, contudo tomados por uma tristeza lancinante. Estão permanentemente em estado de dor.
Há os que percebem e estão paralisados de medo, tentando decidir entre dois grandes medos que sentem ou querendo se abster de decidir. Há os que se abstêm de decidir sem medo.
Há os que não percebem a real gravidade dos fatos que se anunciam, haja vista que não foram atingidos pelo impacto das notícias da explosão de agressividade que se desprendeu das urnas, logo após o resultado do primeiro turno ter sido anunciado. É inegável que houve os ataques violentos por todo Brasil, resultando até em mortes de algumas pessoas que não votaram em Bolsonaro. Homossexuais foram agredidos. Mulheres têm sido constrangidas. Para alguns, nada disso parece fazer sentido e para outros não parece incomodar.
Há muitos e diversos motivos para que as pessoas não percebam seu entorno e não façam a leitura correta dos acontecimentos, o analfabetismo funcional de que se tanto fala pode ser uma dessas razões, mas não será a única. O fato é que não compreender o discurso dos candidatos que disputam um pleito, este especialmente, é realmente um grande perigo. Vale dizer que, de modo especial, não compreender o discurso do candidato do PSL pode ser um risco um tanto acrescido. A fé cega em um líder é coisa que impede os cidadãos de autonomamente questionarem qualquer “verdade” dita por seu, nesse caso não líder, mas ídolo é outro fator a ser apontado. Há também a manipulação pela fé religiosa por meio de lideranças que são notoriamente figuras sem compromisso com a ética ou  com o bem- estar de seus fiéis (notem bem: fiéis). Há outras possibilidades. Não vou enumerá-las todas e nem saberia esgotá-las.
Há, ainda, os eleitores de Bolsonaro que acreditam que o Brasil melhorará sob seu comando e votam nele, simplesmente, por essa razão, são eleitores que prezam o convívio pacífico entre as pessoas. Foi questão de escolha, opinião, preferência. Tudo certo. Ainda que não concorde com a escolha, respeito sobremaneira o direito de eles votarem no candidato que desejarem. Afinal, o respeito às divergências é o cerne do processo democrático.
Há uma infinidade de variedades e matizes que, de forma alguma, compõem a maioria da população. A imensa maioria do povo brasileiro está, como  demonstraram as urnas e têm demonstrado as pesquisas, polarizada. Dentro da maioria eufórica, que é composta por eleitores do candidato que se projeta para a vitória no próximo dia 28 de outubro, há uma fatia de que não consigo precisar a medida nem aproximada que consegue ler o perigo, que concorda com o padrão violento do discurso que tem seguido e que se sente mais e mais empoderada a cada discurso proferido por seu ídolo, por seus correligionários e por alguns de seus apoiadores. É nessa fatia que mora o perigo. É precisamente nela que devemos nos focar nesse momento, tendo em vista que é ela que pode agir violentamente a partir do fortalecimento desse discurso.
A justiça, com a devida vênia, pode até ser cega, mas não pode cerrar os ouvidos aos efeitos de depressão (entre os que fazem oposição ao candidato) e euforia (entre os que o apoiam) que o discurso de ódio do candidato do PSL tem provocado na população.
Quando a justiça não coíbe essas falas, ela passa para a população a sensação de que as está referendando para o mal e para o mal. Não há qualquer efeito positivo em deixar passar essa sensação de normalidade do discurso do candidato do PSL para nenhum brasileiro, quer seja ele de esquerda, de direita, de centro, neutro ou não faça qualquer ideia do que seja isso.
Grafei a palavra justiça com letra minúscula para salientar como uma grande parcela da população, e eu me incluo nela, tem visto a justiça brasileira. Precisamos de uma JUSTIÇA MAIÚSCULA, que nos dê, como cidadãos brasileiros que somos, a sensação da verdadeira Justiça e algum sentimento de segurança. Por ora, o sentimento é desamparo.

Um comentário:

  1. Querida Marise,lendo os seus escritos pensei: como essa menina escreve bem.Porque será q não edita um livro? Atualmente é mais fácil.
    Parabéns, querida. Saudades de você.

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