Os textos foram retornando aos poucos, mas o pranto, esse ficou contido até a última quarta.
Nesse dia, teve "Som Brasil" com Milton Nascimento, Chitãozinho e Xororó apresentando o projeto "Outros cantos" com narração, entrevista e comentários de Pedro Bial. Em um isolamento produtivo, esse EP foi idealizado e gestado no período pandêmico e guardado até que fosse trazido à luz no encontro que gerou o programa.
O programa começa com imagens das avenidas e vias expressas vazias de medo, dúvida e precaução Brasil afora. Lembrei-me das vias desnudas do mundo naqueles dias. Nó na garganta. Emoção. Até que, ao som d"A festa" de Bituca, meu choro rompeu o silêncio áspero com que convivia há mais de três anos.
As lágrimas rolaram em desabafo com os potentes versos do refrão "me abraça, me aperta/me prende em tuas pernas/me prende, me força, me roda, me encanta/me enfeita num beijo", ao recordar daquele tempo em que o toque, o beijo, o abraço e a intimidade eram contraindicados pela ciência e que nós, atônitos, na contramão de nossos desejos, nos esforçávamos para cumprir as recomendações médicas.
Chorar foi o alívio de que vinha precisando há tempos. Hora de ficar sozinha entre cordas e acordes no ritmo latino e vibrante dessa canção que é pura pulsão de vida e que senti como um beijo.
Uma das expressões de Bial, logo no início da apresentação, dá conta de que a música foi um dos remédios que possibilitaram o enfrentamento e a superação daquele momento difícil. De fato foi. Quem não se lembra dos vizinhos cantando nas janelas e sacadas dos prédios na Itália ou dos shows feitos por artistas brasileiros nas varandas dos seus apartamentos? A humanidade se uniu em cantos para preservar sua existência e saúde mental.
O mundo pós-pandêmico tem sido um desatino. Nem parece que aprendemos tanto sobre a fragilidade da vida e a necessidade protegê-la nos últimos anos. Assistir a "Outros cantos" pode ser uma ótima opção dar-se "um pouquinho de saúde, um descanso na loucura". O EP é puro amor e "de amor, andamos todos precisados".