quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Desistir não é fraqueza

Sempre que eu ouço alguém classificar peremptoriamente desistência de fraqueza, eu sinto um incômodo descomunal. Quem foi que disse que só se desiste daquilo que não queremos alcançar? Pelo caminho, apresentam-se várias oportunidades e, vamos acordar, nem todas sãs. E por que insistir nelas, então? 

Desistir também é força. De vontade, de caráter. Pode ser resiliência até. Abrir mão do que se quer pelo que faz bem pode ser um desafio e tanto.

No amor, por exemplo, desistir pode ser a prova mais difícil a se enfrentar. Pode ser uma corajosa opção por si mesmo. Uma renúncia aos afetos que lhe fazem mal. O reconhecimento de um relacionamento tóxico. Uma tremenda declaração de amor próprio.

Desistir quando se ama e de quem se ama exige força e determinação. É preciso tomar impulso para sair de um relacionamento amoroso que não o faz feliz e não lhe confere paz, e, muitas vezes, não olhar para trás para que não seja alimentado o desejo de voltar.

Sofre-se de saudade, de bem-querer, de vontade do que ainda não tinha sido. Do desmoronar de planos. Depois de escolher a si mesmo, desistir é uma prova de resistência diária e pode ser dolorosa.

Ao contrário de fraqueza, em muitos casos desistir é pura demonstração de potência. Coragem de acolher quem se é, de decidir mudar o próprio rumo e se fazer mais feliz.

Pensando bem, pode soar como insolência alguém desmerecer o esforço alheio para reconhecer seus próprios limites.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Trocando as bolas


Celular, no Brasil, era bicho que estava começando a nascer e, portanto, não era difícil cometer erros ao utilizá-lo.

Foi isso o que aconteceu comigo em um dia em que fui de Petrópolis ao Rio e, lá chegando, tentei fazer uma chamada para o número de uma colega.

Ocorreu que, como havia salvado o número dela sem o DDD, a operadora ligou para o número correspondente só que com o código 21.

O que ninguém podia imaginar era que, ao fazer isso, ela modificaria meu destino me fazendo atender a ligações em série naquela tarde.

- Alô, Bia?! - perguntei certa de que estava falando com minha amiga.
- Não! Aqui não tem Bia.
- Ah! Liguei para o número errado, peço desculpas.
- Ok! Respondeu uma voz feminina e pouco simpática encerrando o telefonema.

A minha conversa com a moça do outro lado da linha era para ter terminado aí, mas "era do verbo continuou em uma outra ligação". Não satisfeita com o meu pedido de desculpas e sem crer na possibilidade de se fazer uma chamada por engano, a criatura me telefonou de volta.

- Oi! - disse ela. Olha, pode me falar a verdade, com quem você queria conversar?

De modo geral, as pessoas se referem a mim como uma pessoa paciente, nem sempre essa definição é a que está valendo no momento, mas a moça deu sorte, respondi educada e calmamente detalhando os fatos.

- Eu já disse. Queria falar com uma amiga que se chama Bia, só que o número não estava certo, fazendo questão de explicar a história da troca do DDD.

Depois disso, recebi ainda umas três chamadas do mesmo número. Achei exagerado e estranho. A essa altura com a paciência a zero grau, desliguei o aparelho.

Fiquei com a sensação de que aquela pessoa estava se sentindo enganada por um possível parceiro ou parceira. Afinal, por que tanta desconfiança de que eu quisesse falar com outra pessoa e de que todas as minhas explicações não traduziam a verdade?

Não sei precisar o que se passou com ela. Só o que posso afirmar é que recebi duas notificações de chamada daquele número quando cheguei em casa e religuei o telefone.

Para além disso, é só a constatação de que o outrora bina, hoje identificador de chamadas, nem sempre age para uma comunicação mais eficiente.

Rezem para não trocar seus contatos!

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quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

Batendo um fio

Faz algum tempo, tenho experimentado certos receios relacionados aos avanços tecnológicos de nossos dias. Um claro exemplo desse meu desconforto é o de telefonar para as pessoas.

Sou nativa de um tempo em que a função do telefone era somente fazer e atender a chamadas. Hoje, com as múltiplas funções do aparelho, os telefonemas recebem certas censuras, como se pudessem parecer (e ser) um tanto inadequadas.

Não é raro ouvir alguém dizendo que não atende ligações de números desconhecidos. A era dos números por engano foi abolida à revelia e não está fácil pra ninguém equilibrar os pratos e se posicionar diante das novas (e cada vez mais novas) etiquetas que seguem abrindo passagem.

Aliás, ligue para um número por engano e veja o que pode acontecer. Comigo ocorreu de eu ligar para o DDD errado e a moça do outro lado da linha passar uma tarde inteira me ligando para saber o que eu queria de fato falar com ela, suplicando que eu dissesse a verdade. Minhas frases incisivas dando conta de que fora um engano, não foram suficientes para convencê-la naquele dia e quiçá até hoje. Foi uma chateação.

Outro dia, depois de uns vinte áudios trocados entre mim e uma amiga, tomei fôlego e perguntei:

- Você ainda fala ao telefone?

- Como assim? Que pergunta é essa?!

- De certo modo, as pessoas têm se dividido entre aquelas que falam ao telefone e aquelas que só mandam mensagens, não parece assim pra você?

- Ah! Sim! Nesse caso, sou do tipo que ainda faz e aceita telefonemas de bom grado, respondeu ela identificando os registrando os risos na mensagem escrita.

Passei a mão no telefone, busquei o contato e realizei a chamada fora do aplicativo de mensagens.

- Oi, amiga, tudo bem? Ela me perguntou imediatamente.

Nossa! Foi só ouvir a entonação da voz dela para me sentir mais perto. Sua voz forte chegou a mim como um elixir tonificante cheio de perfume e de cor, exalando energia boa e limpa.

- Estou ótima e você?

A conversa progrediu e lá ficamos a falar do uso dos aplicativos de mensagens e da maneira que cada um faz deles. Como de costume entre nós e nossas conversas, logo vieram outros assuntos e brotaram livres gargalhadas. Batemos um bom papo em tempo real. Telefonar foi uma ótima decisão, apesar de uma quase ousadia.