“Se a bondade de vocês é tão cruel
nem imagino como seja a justiça."
(O Homem Elefante)
(O Homem Elefante)
De
todas as maravilhas que o Teatro pode fazer por nós, a que mais me encanta é a de nos colocar frente a frente com o espelho. Espelho da nossa
alma, do nosso tempo, da nossa sociedade e tantos outros espelhos igualmente
necessários e possíveis. Ir ao espetáculo O Homem Elefante no
Theatro Dom Pedro aqui em Petrópolis foi, verdadeiramente, um desses momentos
de contemplação da nossa sociedade e de nossa (des)humanidade no espelho.
Foto divulgada no facebook do Sesi Cultural |
Na
peça, o menino, que fora abandonado pela mãe, o jovem maltratado, agredido e
explorado por aquele que o exibia publicamente com a finalidade de obtenção de
lucro, toca nossas sensibilidades e nos traz um olhar aguçado sobre a humanidade
e suas contradições. Ao assistir à peça, é impossível deixar de notar uma
sociedade dura e cheia de dualidades: a mesma imagem que gera repulsa e que
dificulta o estabelecimento de laços afetivos com Merrick é a que atrai olhares
cheios da mais perversa curiosidade e que duramente aproxima as pessoas dele.
Se num primeiro momento, é fácil atribuir a Ross, o dono do circo em que era
exposto, toda a crueldade sofrida por Joseph, com um pouquinho mais de atenção,
não se pode negar o mal que tantos olhares adoecidos e tantas agressões físicas
e verbais lhe causaram.
Na
pele do protagonista, o ator Vandré Silveira nos impressiona e nos insere com
maestria no drama da personagem. As expressões corporais, os gestuais, os
gritos lancinantes de um ser humano acorrentado e querendo se libertar das
torturas físicas e emocionais a que era submetido, não só nos conduzem para o
universo de Merrick, como são capazes de despertar em nós empatia e angústia.
Com a cabeça cheia de sonhos e de sensibilidade,
John nos encanta, emociona e nos faz questionar os valores de nossas convenções
sociais. Em que medida as regras nos protegem? Em que medida elas nos condenam?
Que regras devemos seguir? Em que momento devemos quebrá-las para a realização
de um sonho? É correto alguém impedir a realização de um sonho que não é seu?
A representação da relação entre o rapaz e o Dr. Frederick Treves, o médico que o ajudou a levar uma vida mais digna, é um capítulo à parte. Longe da tentadora visão Ross = Mal e Treves = Bem, a peça rompe com o lugar comum do maniqueísmo e expõe seriamente a relação bondade/vaidade/posse em contraposição à liberdade. Impossível sair do teatro sem refletir sobre a questão.
A aquisição da oralidade por John é um ponto alto
de sua transformação. Para quem gosta das letras, ver tão explicitamente a fala
como facilitadora para a relação com o mundo e ver tal habilidade se
construindo diante dos olhos é, sem sombra de dúvida, fascinante. Para quem gosta
da Arte, é um prato cheio assistir a relação entre o rapaz e a Sra. Kendal, uma
famosa atriz e amiga do Dr. Traves, se fazendo. A ligação afetiva entre os dois
põe em evidência o quanto a presença da arte pode ser transformadora na vida de
uma pessoa e o quanto pode ser surpreendente olhar além das aparências. Depois
de observar os dois, difícil é não se afeiçoar a John.
Engana-se quem acredita que, com um texto tão
intenso e dramático, o clima fique pesado o tempo todo. Com uma atuação
primorosa de todo o elenco, a Companhia Aberta nos leva do drama ao humor numa
troca de luzes e cenário, num estalar de dedos. Um humor fino, inteligente e
com a precisão cirúrgica imprescindível para a interação com o público.
Ir ao teatro conferir a montagem é constatar que, se a sagacidade, a inteligência e a sensibilidade de John, estiveram inalcançáveis para os muitos que, a olho nu, só viam o homem elefante, o olhar cruel da sociedade estava o tempo todo afiado e à mostra e, ainda assim, não era notado, era tratado com naturalidade. Por si só este já é um bom motivo para comparecer ao teatro, além disso, a peça é um incontestável espetáculo.
SOBRE A MONTAGEM:
Texto: Bernard Pomerance
Idealização: Companhia Aberta
Encenação: Cibele Forjaz e Wagner Antônio
Assistência de direção: Artur Abe
Elenco: Davi de Carvalho, Regina França, Rogério Freitas e Vandré Silveira
Iluminação: Wagner Antônio
Ir ao teatro conferir a montagem é constatar que, se a sagacidade, a inteligência e a sensibilidade de John, estiveram inalcançáveis para os muitos que, a olho nu, só viam o homem elefante, o olhar cruel da sociedade estava o tempo todo afiado e à mostra e, ainda assim, não era notado, era tratado com naturalidade. Por si só este já é um bom motivo para comparecer ao teatro, além disso, a peça é um incontestável espetáculo.
SOBRE A MONTAGEM:
Texto: Bernard Pomerance
Idealização: Companhia Aberta
Encenação: Cibele Forjaz e Wagner Antônio
Assistência de direção: Artur Abe
Elenco: Davi de Carvalho, Regina França, Rogério Freitas e Vandré Silveira
Iluminação: Wagner Antônio
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