domingo, 3 de setembro de 2017

Palavras ao mar

Sempre que me ponho a escrever, tenho a intenção de organizar as ideias e entender os sentimentos. No papel, na tela, no gravador (mais raramente, quando da urgência de pauta inexistente), faço uma leitura mais eficiente de mim mesma e das várias situações que a vida, que o mundo, que o que vem de fora me traz. Toda vez que torno público um texto, eu o faço da perspectiva da leitora. Publicar, nesse caso, é a partilha das minhas leituras de mundo.

Disponível em Pixabay
Quando divido posicionamentos políticos, idas a peças de teatro, visitas a jardins, entre ouras coisas, eu o faço não da ótica de especialista, que não sou, mas do ângulo da observadora e, vezes, personagem que sou.

Considero cada postagem no facebook ou no blog como uma garrafa lançada ao mar. Um dia a gente escreve um recado, junta a ele uma imagem, um vídeo, ou seja lá o que for, e de casa, do jardim, da escola, do bar, da praça ou de qualquer outro lugar, lança no oceano que é a grande rede de informações que nos conecta. Ah, se eu soubesse desenhar! Faria uma ilustração. No fim das contas, parafraseando o poeta, tenho apenas meu ponto de vista e o sentimento do mundo.

Há garrafas que viajam muito e outras que encalham logo ali na frente. Há aquelas que chegam a locais dos quais jamais tinha ouvido falar e corro para a pesquisa. Umas vezes há interação, outras não. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo, além de não ser uma solução, não seria eu mesma, é claro.

Às vezes escrevo algo de que gosto imensamente e a garrafa quase não segue adiante. Outras vezes ponho na garrafa um inseguro lembrete e aquilo viaja longe e em algumas ocasiões produz até respostas. O mundo das garrafas e dos recados dentro delas, para mim, configura um denso mistério. É imprevisível e fascinante também. Hoje, por exemplo, sem mais nem meio mais, conforme vou escrevendo, vou me lembrando de Drummond e pedacinhos de alguns de seus poemas vão surgindo naturalmente. Fico tentando entender.

Agora, penso em “Mãos dadas”. Nessa questão de não nos afastarmos muito do presente, de seguirmos de mãos dadas num tempo taciturno, mas cheio de esperança. Talvez sejam as notícias de bombas, de guerras, de refugiados, da degradação dos recursos naturais. Talvez seja a face de um Brasil tão sombrio. O fato é que a poesia drummondiana está pulsando mais forte em meus pensamentos hoje, ela é quase um sentimento.

É preciso salvar o país. Salvar?! Quem poderá?! Penso que seja preciso acreditar no país e fazer parte dele e lutar e não o entregar a quem não o ama e simplesmente deseja fazer dele uma reserva de recursos naturais. Tudo isso assim sem vírgulas mesmo. É preciso nos descobrir partes de um todo – isso é tão óbvio, mas inúmeras vezes agimos como se não soubéssemos. Tudo isso parte de uma coisa só, de uma só proposta. O que anda me trazendo o poeta, descubro enquanto escrevo, é o fato de não podemos tudo ignorar como inocentes que não somos. Já cantamos o medo muitas vezes. Aqui e no mundo todo.

A tarde cai dourada e lenta. É domingo. O vinho está na mesa. O pão. O queijo. O sabor. O sabiá anuncia incessantemente que o sol está se pondo, é quase hora de dormir. A calmaria lá fora confronta as inquietações aqui dentro. É um tempo complicado esse nosso. É preciso conjugar a esperança.

A lua se anuncia. Está bonita. É hora de deixar o recado partir, que flua, que viaje, que encontre. São palavras ao mar, escritas nas ondas.

Sobre Drummond:
http://www.revistabula.com/391-os-dez-melhores-poemas-de-carlos-drummond-de-andrade/
https://nsantand.wordpress.com/2016/02/22/carlos-drummond-de-andrade-palavras-no-mar/

Poema de sete faces:




2 comentários:

  1. Minha inspiradora...maravilhosa escritora de vida....amo cada linha...😍...amo você!!!

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  2. Minha querida.
    Você é que é muito generosa.
    Também amo você!
    Beijos.

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