domingo, 26 de novembro de 2017

Das orações naturais

"O bom samba é uma forma de oração."
(Vinícius de Moraes)

Sou do tipo que procura estar em oração e confesso que as orações naturais são as minhas preferidas. Observar o sol nascer lentamente ou vê-lo se pôr anunciando o fim de mais uma etapa. Ouvir a canção das águas de uma cachoeira, o barulho incessante do mar. Escutar o canto do vento e dos pássaros. Ver o céu azul que nos chama à vida. Perder o olhar nas árvores em flor. Sentir o perfume da rosa recém-brotada no quintal. São todas formas de me conectar com o sublime, de transcender o automático e o cotidiano.
Pôr do sol no Leme - arquivo pessoal

O mar salgando meu corpo é paz. O chocalho das conchas voltando nas ondas na beira da praia é louvor. A areia instável sob meus pés é lembrança de que a vida é também mudança e variação, mas que se pode equilibrar. O dourado do sol nas águas salgadas é pura iluminação. O pássaro que mergulha para pescar é beleza. Os movimentos e sons harmônicos do oceano sugerem meditação, encontro, conversa íntima com o Supremo, com o Criador, com Deus ou com qualquer outro nome que o Bem possa ter.

A lua nascendo é encantamento. O céu cheio de estrelas são infinitas possibilidades. Um entardecer cor de rosa ou alaranjado é o coração aquecido. As nuvens formando figuras no céu são sonho. O verde contrastando com o azul é graça. Pássaros voando são uma ode à autonomia. Fruta crescendo no pé, alimento. Água fresca na fonte, refrigério.

As orações naturais me acalmam e me levam à construção de minhas próprias orações. Hoje o vento assovia nos fios e frestas. Sacode as janelas, desassossega as folhas nas copas das árvores. O tempo cinza me diz que nem tudo é bonito, o ar está pesado e a chuva está num-cai-não-cai inquietante. O dia me lembra mudança, me diz que está do jeito que não é pra ser ou por outra, que ele pode ser muito mais do que isso. Traz-me à lembrança as potencialidades e me faz sonhar. Um dia cinza não é um ponto final, mas a véspera de um dia pródigo de sol e alegria. Tudo hoje me faz pensar no tempo de espera e preparação. Lanço mão de um livro.

Vezes, cerco-me de alguns outros tipos de oração: um poema, uma ida ao teatro, um concerto, uma crônica, um romance arrebatador, a tranquilidade de uma igreja vazia, um café com amigos, conversas com o filho, carinho dos pais. Sou do tipo que reverencia a beleza, o afeto e a liberdade. Liberdade de oração, inclusive.  Tudo celebro, agradeço e peço nas mais variadas situações. Tudo o que apazigua considero prece.

Rezar é coisa subjetiva. Cada um tem seu jeito de se elevar, de sintonizar as forças que equilibram o universo em busca do seu próprio equilíbrio. Muitas vezes rezei ao volante, num gostoso bate-papo divinal estrada afora em busca de soluções e de entendimento. Deus é simples e está em toda parte é bom não nos esquecermos disso.


domingo, 19 de novembro de 2017

Muito além de uma xícara de café


Para Douglas e Antônio
pela arte de servir café
c
om tempero de carinho


Torta de frutas secas - Sant`Anna Cafeteria
Era pra ser só um café, um momento de descontração no fim da tarde, um encontro comigo mesma. Já faz tempo que sou dessas, não adio descompromissos por falta de companhia. Teatro, cinema, show, recital, passeio, sorvete, café, nada obrigatório, descompromissos puros e prazerosos em que não cabem adiamentos. Se tem alguém para ir junto, ótimo. Se não, ótimo. Ontem foi assim, eu comigo, meus pensamentos, minhas sensações. Era pra ser só café, foi música, aroma, sabor e muita observação.  Como é bom terminar um dia em que tudo deu certo numa cafeteria! Um dia em que tudo dá errado também. Café é perfeito para um brinde ou como bálsamo.

Tudo corria do mesmo jeitinho: cardápio, simpatia, pedido, café. Clientes comportados e falando baixinho, como são os ambientes de cafeteria em geral. De repente, surge um menino. Ele, acompanhado por pais e avó, trouxe um bocadinho de inquietação àquele lugar. O pula que pula, a voz mais elevada, a brincadeira irreverente do pai com o garoto. Levei um susto. Não é que o rapaz estourou o pacotinho plástico que vem cuidadosamente embalando os talheres?! Ele mesmo se assustou quando se deu conta do que fizera. Eu ri, mas confesso que agitação não era exatamente o que eu estava procurando naquele lugar. Sou de silêncio e sons, ontem estava mais para a segunda opção.

A estada do menino por ali foi curta, como são próprias das paradas infantis em “lugares de adultos”, mas transformadora. Eu disse que era pra ser só um café, mas não foi isso o que se deu. Na saída, bem pertinho de mim, o garotinho deu de cara com uma vitrola. Foi um espanto. Ele jamais havia visto coisa igual e tampouco sabia para o que servia. Curioso, aproximou-se do objeto e crivou o pai de perguntas. O pai bem que tentava explicar na teoria, no entanto não dava conta de satisfazer à curiosidade do filho. Um pouco distante, o proprietário do estabelecimento observava tudo atentamente. Aproximou-se, desligou o som e ligou o toca-discos para o pleno  encantamento do menino. Pacientemente virou o disco e mostrou que do outro lado tinha mais música, o menino silenciou entre a surpresa e a maravilha. Recolheu a experiência, agradeceu e saiu dali levando uma história pra contar.

Eu sorri, dessa vez, emocionada. Havia presenciado um momento de fascínio e descoberta. Além disso, o sorriso generoso do proprietário do café ao ter servido ao menino um tanto de fascínio denunciava a sua satisfação e me fazia lembrar de uma bela crônica de Affonso Romano de Sant' Anna, que nos fala exatamente que “cada um tem um momento, um gesto, um ato em se que individualiza e brilha”. O moço tinha se iluminado ao encontrar o que tem de mais próprio em si: o prazer de fazer o outro se sentir bem, confortável. A cena foi simples, mas me deixou contemplar “o incêndio de cada um”: o menino colhendo frutos de sua curiosidade e o rapaz extrapolando o ato de servir ao doar-se.  Meu café terminou, pedi a conta, vim para casa, mas a poesia daquele instante está presente fazendo eco até agora. Era para ser só um café, mas foi beleza e testemunho dos fragmentos poéticos que a vida nos dá.

É bonito ver alguém fazendo aquilo de que gosta. O contentamento escapa-lhe pelos poros e nos atinge de alguma maneira. Lembrei-me de um balconista da lanchonete da faculdade, seu nome era Messias (eu me lembro e já faz 14 anos que deixei a universidade).  O pão era o mesmo, as frutas também, mas quando ele preparava o suco e o sanduíche, o sabor era diferente. O aprazimento no preparo agregava um tempero especial e inigualável. Há algo mágico que emana daqueles que estão no lugar certo fazendo aquilo que gostam. No lugar que desejam ocupar. A alegria deles nos contagia, vem conosco e nos faz mais ternos e felizes também, a gente se sente mais vivo. A vida é também essa maravilhosa mudança de roteiros. O fim da tarde de ontem era para ser só um café, mas foi muito além disso e, uma vez mais, a cafeteria fez jus a seu slogan.

Confira também a crônica "O incêncio de cada um", de Affonso Romano de Sant´Anna:
https://www.facebook.com/estacaomarisebender/posts/1882150905435258

Cafeteria Sant'Anna, eu adoro.
Rua Dr. Paulo Hervé, 1139
Bingen
https://www.facebook.com/santannacafeteria/





domingo, 5 de novembro de 2017

Como eu era antes de você


De repente a gente se dá conta de que viveu um grande amor. Um sentimento todinho maiúsculo e que, mesmo que não tenha durado a vida inteira, foi capaz de nos transformar para a eternidade. Não que não soubéssemos antes, mas agora essa certeza é ainda mais clara e pungente. E aí descobrimos que nossas vidas estão divididas em antes e depois desse amor. Que ele foi fundamental para o nosso crescimento, que nos fez conviver genuinamente com a partilha, com todas as nossas impossibilidades, que nos apresentou o respeito amplo e irrestrito pelo ser humano que somos. De repente nos damos conta de que fomos verdadeiramente amados e de que em verdade amamos. Que naquele relacionamento não havia rede de proteção. Que era saltar e ter certeza do amparo, do abraço, do afago, da escuta, do beijo, da cumplicidade, do encontro.

Há parceiros amorosos que nos mostram o melhor de nós. Que nos enxergam antes de nós mesmos, compreendem nossas falhas e nos apontam nossas possibilidades, que respeitam nosso tempo de chegada e, sobretudo, não nos apressam. São puro e autêntico acolhimento. Nos veem e, ainda assim, não se espantam, escolhem permanecer, somar, dividir, ouvir, calar e dizer. Escolhem trilhar o caminho lado a lado conosco em harmonia, transcendendo os solavancos que o dia a dia nos dá, ainda que por um tempo. Há encontros que são de corpos, de sentimentos e de almas e que, por isso mesmo, nos fazem querer ser amigos melhores, amores melhores, amantes melhores, pessoas melhores. Do convívio com alguém assim, saímos sempre uma versão aprimorada de nós mesmos. Inteiros e fortalecidos. Damos um upgrade em nossa humanidade. Isso não se mede.

São encontros que suplantam as lembranças e a presença, ficam vivos na pele, nas retinas, no coração, não saem de nós. São pessoas que passam pela vida da gente e fazem morada, ainda que resolvam partir. Gente encantada e encantadora que nos faz ver a vida de um jeito mais simples e que, mesmo ao ir embora, nos deixa a leveza e um refúgio de paz como herança. Gente capaz de plantar em nós uma essência de otimismo e esperança. De despertar nosso olhar mais colorido para a incrível oportunidade que é viver, bem como a habilidade para ver que a felicidade é o grande motivo e que ela existe mesmo em dias tristes ou repletos de saudade.

Há relacionamentos marcantes e amadurecidos que, por motivos, explicáveis ou não, não foram feitos para durar a vida toda. Quando isso ocorre, não há desespero na partida. Há dor, respeito e compreensão. Separação: prova de fogo para qualquer amor. Sua sobrevivência a um abalo desses, a constatação de que a liberdade é laço inquebrantável entre aqueles que se amam. Diante da ausência e da partida do amado, os telefones não tocam desesperada e desesperadoramente nem explodem em oitocentas mil mensagens de amor desaforado que não aceita a decisão do outro. Tudo é paz, ainda que uma paz dolorida e tristonha e que demore um tempinho para se tornar aquela falta gostosa de sorriso de canto de boca a cada lembrança. Há uma beleza cheia de dignidade nesse tipo de separação. O que fica é gratidão imensa por ter podido viver um relacionamento desse quilate. Por ter podido semear e colher a florada dessa relação. Por ambos saírem dela tomados de força e coragem.  A não ser a necessidade de um de partir e o desejo do outro de permanecer, tudo é recíproco. E o respeito suplanta todo e qualquer desejo. Não há espaço para cobranças ou acusações. 

A esta altura, você já sabe que o título desta crônica tem, sim, estreita relação com o filme inspirado no romance homônimo de Jojo Moyes, a que assisti e achei imperdível e fascinante, não apenas pelo grande dilema que propõe, mas por evidenciar as profundas mudanças que um amor pode causar em seus pares, sobretudo quando se está aberto para que elas aconteçam. Um amor assim não se esquece e, quando a saudade bate, ela é só saudade, autêntica e sublime, saudade-presença sem qualquer visgo de melancolia.  Amar é também se abrir, viver e descobrir, na contramão do que diz o poeta, que há amores que se sagram eternos porque duram infinitamente.

Observação:
Foto disponível em https://pixabay.com/pt/p%C3%B4r-do-sol-mar-de-barco-navio-675847/




terça-feira, 12 de setembro de 2017

Sobre a leitura de um manifesto

Acabo de ler o pequeno grande livro “Para educar crianças feministas – um manifesto”, de Chimamanda Ngozi Adichie. O texto é daqueles cuja leitura é rápida e o conteúdo transformador. Nascido a partir de uma carta que a escritora redigiu como resposta à pergunta de uma amiga de infância que, na época, desejava saber como criar sua filha recém-nascida como feminista, o livro propõe caminhos para que tentemos, através da maneira de criar nossos filhos, preparar um mundo mais justo para mulheres e homens e nos faz pensar.

A leitura me remeteu à maneira como fui criada e também ao modo como criei meu filho, hoje com quase 22 anos. Conforme lia, encontrava aquela menininha que um dia eu fui e, não poucas vezes, desejei ter ouvido algumas daquelas palavras ali escritas, para que pudesse ter enfrentado essa vida mais dona de mim e de maneira mais corajosa também. As coisas que são plantadas na cabecinha de gente em tenra idade, às vezes sutilmente, deixam uma herança que em alguns casos precisa ser resolvida no consultório de um terapeuta. Bem, aquilo que passou não tem jeito, está escrito e virou história, mas revisitar o passado sem melancolia é também processo de aprendizado. O negócio é daqui para frente e, saibam, mesmo para mim, uma mulher de 46 anos, ler certas coisas contidas no manifesto, ajudou a fortalecer a alma - a de mulher, a de mãe e a de filha também. É reconfortante e encorajador dar de cara com uma sentença como: “as pessoas vão usar a ‘tradição’ seletivamente para justificar qualquer coisa” e perceber que é a mais pura verdade e que muitas vezes isso está intrinsecamente ligado à manutenção de discriminações e injustiças. Ler o livro da nigeriana pode, mais do que ajudar a criar filhas e filhos para uma vida mais justa, ajudar a fechar velhas feridas.

A autora faz um verdadeiro carinho nas mães, sobretudo naquelas de primeira viagem, quando expõe tão claramente que criar seus próprios filhos é muito mais difícil do que palpitar na criação dos filhos dos outros, que é uma tarefa gratificante sim, mas uma realidade bastante complexa. Dessa forma, ela mesma diz que vai “tentar” criar a sua própria filha segundo as suas proposições - ela foi mãe depois de ter escrito a carta – e incentiva que as mães – citadas na figura de sua amiga – peçam ajuda, que sejam boas para elas mesmas. Lembrei-me de três casais de jovens pais que acompanho bem de pertinho e, com alegria, percebi que têm ideias semelhantes a algumas constantes do texto, na perspectiva da construção de um mundo mais equilibrado, de uma vida mais leve e de uma realidade com mais justiça.

Ver meu filho aqui em casa também me enche de contentamento. Ver o cara respeitador das individualidades alheias que ele é, é constatar que ensinar a ele sobre a diferença, sobre não atribuir valor à diferença, foi parte fundamental de seu processo educativo. É claro que também cometi erros pelo caminho, todos cometem, muita vez, falar sobre eles também é importante. O diálogo, a confiança, a disponibilidade para oferecer a linguagem ao seu filho são coisas de suma importância e Chimamanda fala sobremaneira sobre isso. Aliás, sobre a linguagem, há uma frase belíssima e que gera reflexão imediata: “a linguagem é o repositório de nossos preconceitos, de nossas crenças, de nossos pressupostos. Mas, para lhe ensinar isso, você terá de questionar sua própria linguagem.” Aí está explicitada de forma contundente a importância crucial da linguagem em nossos relacionamentos, em nossa relação com o mundo e na perpetuação ou não da transmissão de conceitos equivocados aos nossos filhos.

Sempre me debati com a palavra pãe. Jamais gostaria de receber parabéns no dia dos pais. Sempre me entendi como mãe. O abandono emocional de seu próprio pai – quer seja biológico ou adotivo - é uma ausência que uma pessoa leva para a vida toda, mesmo que busque e encontre referências em um avô, um tio ou em um amigo ou namorado de sua mãe, mesmo que supere esse trauma. Muitas pessoas podem até esquecer que ser pai é muito mais do que ser um provedor e escolherem exercer somente o segundo papel ou nem esse, mas o fato de um filho ter sua mãe ali presente o tempo todo diante dessa ausência, significa apenas que o filho tem a mãe presente, que ela é a melhor mãe que consegue ser, e não que ela esteja exercendo os dois papéis. O contrário também é absolutamente verdadeiro. Adichie exalta a relevância dos dois papéis, refuta o uso da palavra pãe, e nisso concordo em absoluto com ela.

Mais do que um roteiro para a criação de crianças feministas, o livro é uma importante reflexão sobre a importância da educação de nossas crianças para a construção de um mundo em que haja respeito à diversidade, respeito entre as relações humanas e, sobretudo, respeito ao espaço e à autenticidade de cada um no convívio social. O livro é pequeno, tem preço acessível, a linguagem é clara e objetiva, a leitura é fácil e rápida e seu conteúdo é transformador. É um livro fundamental.


CONHECENDO UM POUCO MAIS DE CHIMAMANDA ADICHIE:"O perigo de uma história única"
https://www.ted.com/talks/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story?language=pt-br

domingo, 10 de setembro de 2017

Alquimia em processo

(Sobre "Processo de Conscerto do Desejo")

É escuro, surgem ruídos que não se pode identificar, há um violão e um desamparo. Só eu que sinto esse perfume espalhado pelo ar? Ela dorme. Princesa, rima ocultada, estrela atrás da nuvem. Dorme.

Foto de Fábio Seixo
A voz de Matheus ecoa ainda tímida, vem do palco e não o vemos. Aos poucos, ele desenha em tinta vocabular o início de sua história e corajosamente a divide conosco. O pranto, o dele e o nosso, é inevitável. Há uma grande vontade de abraçar o triste e solitário menino que se despe de suas feições adultas diante dos nossos olhos, ainda que estejamos todos numa penumbra incômoda. Triste, solitário, magoado e transbordando de dor, de amor, de saudade. Ela se matara, quando ele tinha apenas três meses.

O desejo de trazer Maria Cecília para a luz se cumpre. Se faz por letras, sílabas, palavras, versos inteiros, músicas e gestos, ora delicados, ora vigorosos e cheios de tenacidade. Quase um balé.

Delicadamente vão surgindo as angústias da mãe de um bebê recém-nascido que chora, mama, dorme, suja as fraldas e, vez por outra, tem essa rotina quebrada por um evento cheio de preocupação: o vômito. A maternidade em sua face nada glamorosa aparece e vem contracenar com o menino.

O texto é mais que um diálogo, uma vivência. É processo. Participamos todos da tristeza que provoca uma vida que se vai tão cedo, da falta de colo e do brinquedo colorido, da queda solitária da criança. A melancolia é irremediável, o moço essencialmente triste e com jeito de quem está querendo ser criança outra vez não a espanta dos olhares à luz. A dor é um direito, precisa ser vivida.

No tablado, a ferida é exposta com delicadeza em uma mistura terna, e áspera, e dolorida, que a ausência provoca. Ao som primoroso de violão e violino, o ator se estilhaça e se recompõe sob nossos olhares comovidos e atônitos e nos conduz, através dele mesmo, da poesia e da música, à conversão da melancolia em beleza, coisa que só pode fazer mesmo quem tem as mãos de um jardineiro quando está chovendo.

O espetáculo de Matheus Nachtergaele é poesia em movimento. É alquimia. É a transformação do sofrimento em arte. É uma flor brotada da sensibilidade e da intensidade que só tem um menino-homem que transpira amor e sorri à toa. É um convite para valsar apesar do destino, por mais duro que ele possa ser.

Processo de Conscerto do Desejo é o mais perfeito e generoso poema composto a quatro mãos por Matheus e Maria Cecília,  numa parceria imperdível. É preciso ir ver.


SOBRE O ESPETÁCULO:
Matheus Nachtergaele ficou órfão de mãe aos três meses de idade. Maria Cecília, que cometera suicídio, deixa alguns textos e poemas aos quais o ator tem acesso na adolescência, através de seu pai. Na vida adulta, na tentativa de superar a dor que o fato traz à sua vida, Nachtergaele realiza o emocionante espetáculo com os poemas de sua mãe e convida o público a participar dessa superação num sensível concerto de voz, atuação, violino e violão. A arte é o principal instrumento desse processo.


Matheus Nachtergaele declamando um dos poemas de sua mãe:
https://www.youtube.com/watch?v=D3joAP6js4E

Foto de Fabio Seixo (A quem agradeço pela autorização para o uso da imagem)
Agência O Globo - disponível em:

https://oglobo.globo.com/cultura/teatro/nachtergaele-celebra-mae-morta-quando-ele-tinha-3-meses-em-peca-17997243

Mais poesia:
(Atualização em 16.09.2017)

Concebi o espetáculo como um poema a quatro mãos: Matheus e Maria Cecília. Sendo assim, reuni aqui o belíssimo registro fotográfico da apresentação da peça em Petrópolis, a partir das lentes sensíveis e cheias de expressividade do fotógrafo Marco Oddone, e os versos de Maria Cecília Nathtergaele. Que maravilhoso concerto!







Eu procuro alguém 
Para fazer uma poesia comigo
Tem que ser terno e triste
É essencial que seja triste








Gestos de poeira
Muita saudade
Medo
Os olhos de até logo
Com jeitinho 

de adeus.







Tem que ser distraído
Sorrir à toa
Sempre querer chorar
Mas nunca conseguir







E ter amado muito
E ter sofrido
E andar de poeta 
Que fala sozinho
E falar muito 
abandonadamente










É preciso ter jeito
De quem está querendo 
Ser criança outra vez
E as mãos...
As mãos de um jardineiro
Quando está chovendo







Que nunca saiba
Como começar a falar
Mas sempre saiba 
Como começar a sorrir












Mas a maior urgência que existe
O essencial,
Muito essencial,
É ser imensamente triste.


Maria Cecília Nathtergaele






quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Um soco no estômago

Não, não fale! Eu não quero escutar. Cale, vai, quebre essa. Me deixe fora dessas reflexões tão duras. Mantenha esse silêncio de estourar os tímpanos, bote uns panos quentes e não me mostre. Eu não quero ver nem ouvir, muito menos pensar que tudo isso pode ser verdade e pode acontecer.

É duro! Qualquer um que trabalhe na área da saúde, em que o sigilo é tão precioso e tão caro, sente um violento incômodo já nas primeiras cenas do filme. É uma obra áspera, sem burilações e refinamentos. Trata daquilo que se quer empurrar para debaixo do tapete.

O silêncio, a solidão acompanhada dentro de uma família até na hora do jantar. O pai ali num papel secundário. A solidão da criança em casa. O desconhecido (alô!). A fantasia (é você, fulano?). O desequilíbrio, a transgressão, a dor, o preconceito. O afeto. A complexidade. A alternância de papéis. O agressor, o opressor, a vítima. Quem é quem nesse jogo da vida? 

A terapeuta que rompe os códigos de sua profissão advogando em causa própria e aquela coisa de ver mais uma vez o profissional de saúde mental perdendo a linha, o tom, misturando o pessoal e o profissional e é possível que se fique pensando: mas isso não afastará ainda mais as pessoas desses profissionais? Não fará aumentar o preconceito?  Bem, já há algum tempo tenho questionado um pouco essa maneira de olhar para a ficção como um impulso para a realidade. Vejo a ficção como um mote para a discussão, não como um padrão a ser seguido. Entendo que ela possa influenciar comportamentos, mas acho que a discussão tem que ser ainda anterior a isso: se é assim, por que estamos seguindo padrões "impostos" pela ficção? E que "imposição" é essa? Quem a está permitindo? Estamos mesmo assumindo que é a ficção e são as mídias que ditam o que devemos fazer sem questionar?

A gente se mexe na poltrona do cinema, ora irritado, ora constrangido, ora perplexo, sempre reflexivo. "Fala comigo",  o filme de Felipe Sholl, com cenas cuidadosamente trabalhadas e com belíssimas atuações, toca em pontos incômodos, expõe tabus e fica reverberando na gente depois da sessão.

É, sim, é mais fácil olhar para o outro lado, pedir um café, fingir que não vê, mas as situações estão aí o tempo todo em todo lugar e, quer queiramos ou não, continuarão existindo, e por que não falar sobre elas?

Trailer oficial:
https://www.youtube.com/watch?v=o8BqKYjV6qM

quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Na pele dele

Ler o livro de Lázaro Ramos é, de fato, como propõe o título, vestir a pele do autor. É olhar o mundo do ponto de vista dele e descobrir alguns ângulos antes nunca perscrutados. Ao menos comigo foi assim.

Muita gente defende a meritocracia como um caminho lógico e claro e diz por aí que quem luta, quem nada contra a corrente das várias violências e ameaças sofridas - veladamente ou não - vence, que superar as dificuldades é só uma questão de determinação, como se aquele que não vence fosse simplesmente fraco ou desistisse no primeiro espinho. Acho essa questão um pouquinho mais complicada e ler "Na minha pele" me ajudou muito a enxergar essas complicações com mais clareza. É que o ser humano não é constituído apenas de razão e de decisões racionais - e quase todo mundo sabe disso, mas sempre é bom repetir  - há muito sentimento e emoção na humanidade de cada um e, nem sempre, acessar a lógica, traçar um caminho e seguir é simples assim. Há caminhos que sequer conseguem ser traçados, cada um reage de um jeito aos acontecimentos desse mundo. Ainda é, para mim, um denso mistério a reação de cada um aos mesmos fatos e como enquanto uns fazem disso a mola propulsora para alcançar, mais do que seus objetivos, suas potencialidades, outros paralisam e não conseguem prosseguir. Na especificidade de cada um há coisas que causam marcas em uns, deixam de atingir outros e dilaceram alguns. Não dá para julgar todo mundo por um, fazer isso é, no mínimo, leviano. Como tão bem ressalta Lázaro, as exceções vêm, muitas vezes, confirmar as regras.

O autor salienta o tempo todo o quanto foi importante para ele o conhecimento de si mesmo: "Compreender o que fazia sentido para mim foi libertador, pois assim é que buscamos o nosso caminho". Não é por acaso que essa frase está inserida no capítulo "Escolhas". Penso que talvez o que haja de especial nas exceções é que essa consciência do sentido tenha vindo cedo. Talvez e só talvez, é preciso frisar bem isso. Muitas vezes esse sentido, tão necessário para traçar um caminho, não vem na ordem cronológica. Há muitos caminhos e, vez por outra, sem encontrar o sentido, toma-se uma direção diversa daquela que seria a mais acertada para o desenvolvimento pleno do potencial de cada um.

Para além disso, o escritor cita inúmeras vezes o quanto foi importante, apesar das dificuldades relativas ao toque, receber desde sempre o afeto de sua família. É possível ler nas entrelinhas que Lázaro foi amado desde sempre e que isso fez toda a diferença. Nas linhas, ele destaca: "afeto é potência" e é nesse sentido que está conduzindo a educação de seus filhos para que sejam seres livres e plenos, que desenvolvam suas potencialidades com um olhar de respeito para eles mesmos e para os outros. É curiosa essa coisa de fazer sentido, não é mesmo? Isso acontece também com as expressões. Um dia a gente ouve algo que já tinha escutado, mas que alguém fala de um jeito diferente e plim, aquilo nos toca. Sentimos, então, aquela sentença como verdadeira, a visão se amplia. Foi o que aconteceu comigo ao ler "afeto é potência".

Toque, carinho, palavras de incentivo, referências, tudo isso é cuidadosamente tratado no fluido texto do autor. Ele traz uma linguagem leve, o que nos faz passar por temas árduos e chegar a importantes reflexões sem aspereza. Diz daquilo que a maioria já sabe, mas que é preciso repetir o tempo todo: "racismo é motivo de discriminação diária, sim". No entanto, coerente com aquilo que ele mesmo traz, é preciso dizer isso, mas sem se apropriar da linguagem do opressor. Numa proposta consciente e decisão manifesta, destaca a importância da inteligência e da delicadeza para abrir e ampliar a escuta. 

Na pele dele eu pude ver e sentir um outro olhar do mundo e, algumas vezes, fiquei incomodada na minha própria pele. Algumas vezes na pele dele ou na minha pele esse ângulo do olhar do mundo nos aproximou, se não foi o racismo que apontou a minha "inadequação", foi outro ismo igualmente opressor das diferenças alheias e me pôs a pensar: e se além de todas as minhas "não conformidades" eu tivesse a pele dele, como seria? O olhar do mundo não seria ainda mais inquisidor comigo? O humor muitas vezes foi a saída encontrada por ele, por mim e por tantas outras peles em caleidoscópicas circunstâncias. Na pele dele pude enxergar com olhos que não são os meus, pude ver além de mim e me encontrar e essa é uma experiência singular. "Na minha pele" é uma proposta de viagem em outra pele e dessa travessia dificilmente não se sairá transformado. Isso não preço!

(Publicado no site NotaTerapia em 29/09/2017 - Link para acesso: http://notaterapia.com.br/2017/09/29/na-minha-pele-de-lazaro-ramos-ou-como-se-colocar-na-pele-de-outra-pessoa/)

domingo, 3 de setembro de 2017

Palavras ao mar

Sempre que me ponho a escrever, tenho a intenção de organizar as ideias e entender os sentimentos. No papel, na tela, no gravador (mais raramente, quando da urgência de pauta inexistente), faço uma leitura mais eficiente de mim mesma e das várias situações que a vida, que o mundo, que o que vem de fora me traz. Toda vez que torno público um texto, eu o faço da perspectiva da leitora. Publicar, nesse caso, é a partilha das minhas leituras de mundo.

Disponível em Pixabay
Quando divido posicionamentos políticos, idas a peças de teatro, visitas a jardins, entre ouras coisas, eu o faço não da ótica de especialista, que não sou, mas do ângulo da observadora e, vezes, personagem que sou.

Considero cada postagem no facebook ou no blog como uma garrafa lançada ao mar. Um dia a gente escreve um recado, junta a ele uma imagem, um vídeo, ou seja lá o que for, e de casa, do jardim, da escola, do bar, da praça ou de qualquer outro lugar, lança no oceano que é a grande rede de informações que nos conecta. Ah, se eu soubesse desenhar! Faria uma ilustração. No fim das contas, parafraseando o poeta, tenho apenas meu ponto de vista e o sentimento do mundo.

Há garrafas que viajam muito e outras que encalham logo ali na frente. Há aquelas que chegam a locais dos quais jamais tinha ouvido falar e corro para a pesquisa. Umas vezes há interação, outras não. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo, além de não ser uma solução, não seria eu mesma, é claro.

Às vezes escrevo algo de que gosto imensamente e a garrafa quase não segue adiante. Outras vezes ponho na garrafa um inseguro lembrete e aquilo viaja longe e em algumas ocasiões produz até respostas. O mundo das garrafas e dos recados dentro delas, para mim, configura um denso mistério. É imprevisível e fascinante também. Hoje, por exemplo, sem mais nem meio mais, conforme vou escrevendo, vou me lembrando de Drummond e pedacinhos de alguns de seus poemas vão surgindo naturalmente. Fico tentando entender.

Agora, penso em “Mãos dadas”. Nessa questão de não nos afastarmos muito do presente, de seguirmos de mãos dadas num tempo taciturno, mas cheio de esperança. Talvez sejam as notícias de bombas, de guerras, de refugiados, da degradação dos recursos naturais. Talvez seja a face de um Brasil tão sombrio. O fato é que a poesia drummondiana está pulsando mais forte em meus pensamentos hoje, ela é quase um sentimento.

É preciso salvar o país. Salvar?! Quem poderá?! Penso que seja preciso acreditar no país e fazer parte dele e lutar e não o entregar a quem não o ama e simplesmente deseja fazer dele uma reserva de recursos naturais. Tudo isso assim sem vírgulas mesmo. É preciso nos descobrir partes de um todo – isso é tão óbvio, mas inúmeras vezes agimos como se não soubéssemos. Tudo isso parte de uma coisa só, de uma só proposta. O que anda me trazendo o poeta, descubro enquanto escrevo, é o fato de não podemos tudo ignorar como inocentes que não somos. Já cantamos o medo muitas vezes. Aqui e no mundo todo.

A tarde cai dourada e lenta. É domingo. O vinho está na mesa. O pão. O queijo. O sabor. O sabiá anuncia incessantemente que o sol está se pondo, é quase hora de dormir. A calmaria lá fora confronta as inquietações aqui dentro. É um tempo complicado esse nosso. É preciso conjugar a esperança.

A lua se anuncia. Está bonita. É hora de deixar o recado partir, que flua, que viaje, que encontre. São palavras ao mar, escritas nas ondas.

Sobre Drummond:
http://www.revistabula.com/391-os-dez-melhores-poemas-de-carlos-drummond-de-andrade/
https://nsantand.wordpress.com/2016/02/22/carlos-drummond-de-andrade-palavras-no-mar/

Poema de sete faces:




terça-feira, 29 de agosto de 2017

Rosa vívida

Para Rosa,
minha avó querida.


Cabelos brancos.
Ombros curvados.
Passo feminino e lento.

Pelas lentes octogenárias
o mundo parece um canto simples.
Rotina. Rudimentar.Trivial.
Deslumbramento.
Riso compreensível
diante de juvenis afobações.

Lugar de aprendizado é trajeto
e trajeto é sempre.
Florescendo aqui em casa

O vento muda de uma hora para outra.

Muda o tempo, a direção.
A paisagem muda,
vezes emudece, vezes soa.
A vida é um tilintar
de movimentos.

Na roda viva
até a lucidez se esvai.

Vívidos delírios
de amor intacto.
Palpável e utópico.
Namora moinhos de vento.
Fiéis desejos.
Partida entre nuvens confusas
de parcial realidade.

A vida é só momento.

domingo, 27 de agosto de 2017

O filme da minha vida


Se há um programa de que gosto nessa vida é cinema. Sozinha ou acompanhada, na primeira ou na última sessão, a telona me fascina e, na imensa maioria das vezes, me proporciona uma viagem. Foi o que aconteceu vendo o novo filme de Selton Mello, livremente inspirado no livro “Um pai de cinema”, do chileno Antônio Skármeta. O longa traz uma gama de questões fundamentais abordadas de maneira cuidadosa e delicada e merece destaque também pela fotografia que revela, além de belezas naturais do sul do Brasil, um longo e trabalhoso estudo. 

Decidir nem sempre é fácil. Pode gerar arrependimentos e às vezes gera. Muitas vezes se quer mudar o presente, mas o peso do passado parece nos impedir. Muitas vezes não podemos transpô-lo sozinhos, precisamos do amor, da generosidade, do impulso e da torcida daqueles que nos têm afeto.


A história do rapaz que sente a ausência de seu pai, um homem que deixa a família e vai para a França e o aprofundamento de seus laços afetivos com a mãe, enquanto se inicia em sua profissão e descobre seu primeiro amor é envolvente e cheia de nuances para a além do drama principal.

Ali naquela poltrona de cinema, vi a vida passar diante dos olhos viajando numa locomotiva, perfeita metáfora para os caminhos que a gente segue e para tudo aquilo que pode nos tirar dos trilhos. Vezes, uma simples decisão pode ser a mudança de uma vida inteira, de um jeito de olhar a estrada, da mudança de hábitos para a aquisição de cuidados antes sequer considerados. Todo mundo tem em sua história um divisor de águas, um fato que o modificou profundamente e para a vida toda. Às vezes, numa descomprometida conversa com um maquinista, esse fato vem à tona, sobressai. A vida é mesmo diálogos e trajeto.

Sentada na poltrona do cinema, entrando e saindo daquele trem e pensando nos deslizes que têm consequências permanentes e que modificam significativamente as nossas vidas, fui me deixando encantar por Tony Terranova, por suas coragens e fraquezas. Entre uma viagem e outra, entre uma sessão de cinema e outra ali na tela, o filme foi se revelando e se tornando mais próximo.

Quem de nós não apostou na pessoa errada? Quem de nós não viu um amigo onde havia somente interesse próprio e manipulação da verdade? Quem de nós não se deixou seduzir apenas pela beleza? Quem de nós não teve na vida uma grande decepção? Decepções podem, em muita medida, ser o impulso que faltava para uma tomada de decisão, a superação necessária de um medo para a revelação de doloridas verdades. Decepcionar-se pode ser o caminho para o ponto de vista que faltava, para que se tivesse noção do todo em uma situação. Embora provoque dor e demande o esforço da recuperação, pode ser a retirada da árvore que, tombada na estrada, impede-nos de avançar.

O drama da ausência do pai. O drama da falta de uma razão, de uma explicação. O drama de saber que qualquer dúvida pode ser pior do que a mais dura certeza, uma vez que  a dúvida pode fazer paralisar, é sensivelmente retratado na tela. E porque o drama não é a única face da vida, a veia cômica surge para fazer mais leves os momentos dramáticos da caminhada. Cabem sorrisos e tristezas e revisão de posicionamentos diante dos dramas humanos apresentados.

E como é importante tentar colher a verdade na fonte e não apenas no discurso de terceiros. O controle emocional para permitir-se a descoberta é uma arte custosa, mas pode trazer benefícios àqueles que em lugar da pressa têm bons propósitos e firmes objetivos. Nada disso é fácil nem indolor, mas gera crescimento e, algumas vezes, o resgate da esperança. Nem sempre a situação é tão feia quanto se vê num primeiro olhar.

O filme fala de amor e de cobiça o tempo todo. Assim é a história, assim é a vida. O amor, sem dúvida, é a parte ensolarada do filme. E não será da vida? O despertar do bem querer e do afeto entre os jovens, a descoberta do sexo, a alegria provocada por tais revelações. Tudo é luz. Uma luz pálida e repleta de nostalgia, como convém a qualquer lembrança. Amor de pares. Amor de pai. Amor de mãe. Amor de filho. Acerto, erro,  caminhada e o contraste com um tempo que já vai longe e que também tinha hábitos nada saudáveis e que confrontam os dias atuais. Era muito cigarro, pouco cinto de segurança e nada de capacetes. Era assim mesmo. É... algumas coisas mudam para melhor.

Selton também aparece na tela e como não observar o ator talentoso, o diretor sensível e competente e o homem maduro que se tornou? Está belo e forte. Sua presença é enriquecedora e marcante, como acontece com aqueles que se encontram no auge de sua carreira.

O filme acabou. Eu e algumas outras pessoas permanecemos sentados, enquanto numa tela escura subiam letrinhas e mais letrinhas ao som de uma melíflua e apaziguadora canção francesa. Não havia pressa em deixar o cinema. Indubitavelmente tínhamos ganhado duas horas em nossas vidas.


TRAILLER OFICIAL DO FILME

domingo, 20 de agosto de 2017

Salve a fantasia!

A arte existe porque a realidade não basta.
(Ferreira Gullart)


Não é segredo pra ninguém que muitos estudiosos e escritores ressaltam o poder da arte e da beleza, dentre outras coisas, para a promoção e a manutenção da saúde mental e emocional daqueles que, de algum modo, a elas se entregam. A arte salva nossas sensibilidades. Neste momento particular de dificuldade por que todos nós passamos, acho que precisamos de terapia intensiva. Quanto mais arte melhor. Tenho aceitado a prescrição daqueles caras. São doses de poesia, crônica, romance, pintura, música, dança, teatro e muito mais. Além disso, muita beleza natural, deliciosas conversas e a presença de gente cujo afeto aquece a alma e o coração são elementos fundamentais.

Dia desses, fui ao Theatro Dom Pedro em companhia de familiares e amigos assistir a uma montagem de “Sonho de uma noite de verão”, de Shakespeare. Foi verdadeiramente uma noite de sonhos. A montagem feita pela Companhia Arteira de Nova Friburgo transportou-nos à fantasia e trouxe-nos o delicioso contato com nossa criança interior, através da mescla entre humanos e fantoches no palco. A perfeição dos movimentos dos bonecos, a delicadeza do cenário e da música e uma primorosa atuação nos colocaram, por mais de uma hora, em contato com o sublime.

Foi uma grande sacada da trupe fazer os fantoches representarem os personagens humanos, numa linda metáfora para a interferência dos seres élficos em seus destinos. Coube, então, aos atores a representação dos seres elementais. As trapalhadas de Puck, numa esplêndida e envolvente atuação de Cássio Campos, levaram-nos às gargalhadas, enquanto a riqueza musical foi, sem dúvida, uma facilitadora para sonhássemos regidos pela maestria de Shakespeare. Antes que provássemos da flor encantada, estávamos todos apaixonados.
Dia do espetáculo - foto da Companhia Arteira

Floresta. Desejo. Sonho. Conflitos. Elfos. Fadas. Vaidade. Manipulação. Dúvida. Destino. Amor. Tudo ali sensivelmente retratado numa viagem fantástica e poética para a posterior reflexão sobre os grandes dramas da humanidade. O teatro é mesmo um espaço privilegiado. Não raras vezes nos tira da apatia e nos põe representados no palco ou em contato com algo que desconhecíamos em nós.  Pode nos refletir por dentro e por fora, tão necessário susto. A arte tem essa extraordinária capacidade de nos abismar, algumas vezes de maneira muito leve e lúdica como nessa montagem. Sonhos, gargalhadas, talento, criatividade e beleza: tudo num só espetáculo. O teatro pode ser bálsamo para as agruras da vida e um portal escancarado para um mundo além do físico. De fato, viver só de realidade não basta.



SOBRE O ESPETÁCULO:
Gênero: Comédia
Duração: 90 minutos

Direção: Gabriela Ribas
Supervisão de direção para manipulação de bonecos: Marise Nogueira
Trilha sonora original e direção musical: Diogo Rebel
Elenco: Cacá Pitrez, Cássio Campos, Catherine Bom, Gabriela Ribas, Gero Band, Jerônimo Nunes, Maria José Silva, Nathália Newlands e Silvia araújo
Cenografia: Silvia Araújo
Figurinos: Joanna Ribas
Artesã bonequeira: N´vea Semprini
Iluminação: Erlom Cordeiro

terça-feira, 1 de agosto de 2017

Podres poderes

Saí de casa inocentemente para assistir a um show de Caetano Veloso. Tudo estava muito tranquilo até aquele moço elegante trajado de azul, no mais puro estilo um banquinho e um violão, começar a cantar. Nos primeiros acordes de Luz do sol, entrei em contato com um tempo que passou. Parece que fiz uma conexão com a minha adolescência e com o início da minha vida adulta, com os anos 80, com a conquista de direitos e a valorização da vontade popular.

Adolesci num tempo de luz, de abertura, de iluminação sobre o que tinham sido anos soturnos no Brasil. Embora não tivesse engajamento nos movimentos que vinham lutando pelas eleições diretas, era impossível não participar disso de alguma maneira. Os jovens e os nem tão jovens estavam nas ruas e Coração de estudante, de Milton Nascimento, era quase um hino. Era cantada nas escolas, nos bares, nas ruas. Tinha um ar de acalanto, de energia, de alegria e, sobretudo, de esperança. Acompanhei a eleição indireta, a morte de Tancredo, a inflação a galope. No meu primeiro ano de faculdade, só se falava nas eleições diretas.  Eu me lembro das campanhas eleitorais, da desinterdição das urnas depois de tantos anos em que estiveram lacradas. Era uma energia boa de um povo que começava a tomar as rédeas do processo democrático de seu país novamente. Era a energia carregada da esperança de um futuro melhor. Da construção de um país bom e justo para a juventude criar seus filhos e a maturidade ver crescerem seus netos.

Quando houve o impeachment de Collor de Mello, já acompanhei mais de perto. Vi brotarem os cara-pintadas aqui e ali e se tornarem atuantes em todo o país, me recordo bem, o som das ruas era uníssono. A grande maioria da população já não desejava aquele presidente, tinha pesadelos com Zélia Cardoso de Mello, a ministra que, no primeiro momento do governo, confiscou a poupança de uma parte significativa da população brasileira. Não foram só aqueles que tinham alguma reserva que ficaram com suas contas bloqueadas. Houve gente que tinha vendido um imóvel para comprar outro, por exemplo, e que diante do confisco ficou sem ter onde morar. Houve dor, houve suicídios, a coisa não foi brincadeira. Quando o presidente foi deposto, havia o sentimento da maioria de que isso havia sido justo.

Desse modo, tudo o que vivi na adolescência e juventude foi uma escalada ascendente de liberdade e de conquistas. Minha geração aprendeu a encher o peito e a boca e sacar as leis afirmando que tinha direitos. Eu acreditei. Cresci nessa onda e na ilusão de que os direitos, uma vez conquistados, estavam garantidos, que era pra frente que se andava, que havia direitos adquiridos. Sendo assim, os recentes acontecimentos no Brasil têm sido, mais do que um soco no estômago (ou muitos socos, sinto-me golpeada todos os dias), um momento de reflexão e da constatação de que direitos são apenas circunstanciais e que, para a sua manutenção, temos que cuidar deles o tempo todo. Do contrário, de um minuto para o outro, entre acordos e conluios, se esvaem e todos perdem.

Tá certo, a gente vê aqui e ali mundo afora as ameaças à democracia diante de nós na TV, direitos ruindo nos mais diversos lugares, mas a televisão é tão asséptica que tem qualquer coisa de ficção, de distanciamento, de nos informar como se estivéssemos todos longe daquele ponto. A TV nos ilude e nos adormece todos os dias. Se não fosse assim, como seria possível ter um aparelho desses na sala de jantar? Como comer diante das notícias e imagens de guerras e de mutilações? Eu acompanhava as democracias ameaçadas a distância, mas não via o risco aqui tão perto.

A realidade começou, nesse sentido, a me dar uns solavancos quando, logo depois da apuração dos votos nas eleições para presidente em 2014, alguns inconformados com o resultado das urnas começaram a pedir o impeachment da presidente eleita e tais protestos começaram a ganhar força com a participação de alguns políticos brasileiros. A oposição naquele momento começava a mostrar a sua face predadora em prol de um resultado e em detrimento da valorização da nação brasileira e do processo democrático, fomentando a divisão nascida na disputa eleitoral.

Quando Trump venceu as eleições dos EUA eu tive muita inveja dos americanos, muita. Não desse inacreditável resultado.Tive inveja da postura responsável de sua oposição. Da fala de Hillary Clinton que, diante da derrota, que nem ocorreu nas urnas, não perdeu a clareza de que o país era maior que seu umbigo e, portanto, conclamou os americanos à união pelo crescimento de todos. No Brasil, apesar do discurso do candidato derrotado nas urnas, não tivemos uma oposição responsável. Faltou à oposição, desde as últimas eleições, a grandeza de perceber o Brasil como um país. Ao contrário disso, o que houve foi o estímulo irresponsável e em causa própria para que seus eleitores fossem às ruas pedir o impeachment de uma presidente democraticamente eleita, no momento seguinte ao resultado do pleito. Faz parte do processo democrático aprender a perder. Há que se ter grandeza para continuar lutando por seus objetivos sem sabotar o processo legítimo das urnas.

A oposição sabotou o quanto pôde um governo legítimo. Foram pautas e mais pautas travadas no Congresso Nacional para levar o governo ao insucesso. O país ficou ingovernável. A crise econômica foi agravada. Um presidente, haja vista os “acordos e mais acordos” que têm sido feitos pelo presidente Temer, não pode governar sozinho. Mais tarde, diante das gravações apresentadas pela Operação Lava Jato, ficou claro nos diálogos de Sérgio Machado com Romero Jucá, que o medo, o pavor era de que aquela operação levasse boa parte deles ao naufrágio de suas carreiras políticas construídas nem sempre na legalidade. Desse modo, foram articuladas alianças e mais alianças para que salvassem a própria pele. O que fez a oposição nesse tempo todo? É como se ela, como dizem, tivesse descarrilhado o trem para depois “salvar” os feridos. Houve vítimas fatais? Para vítimas fatais cuidados médicos não resolvem coisa alguma. A oposição estimulou e promoveu o impeachment a um preço altíssimo para salvar sua própria pele. Sem falar naqueles que mudaram de lado pelo mesmo motivo.

Para agravar a crise vivida pelo governo Dilma naquela ocasião, faltou sensibilidade ao referido governo para lidar com uma parcela significativa da população que não o apoiava e que foi às ruas se manifestar.  As medidas tomadas pelo governo estabelecido ajudaram a pôr gasolina no fogo e a incendiar as possibilidades de reversão daquela situação. Àquela altura os movimentos já tinham certa autonomia e repudiavam alguns dos políticos que o incentivaram, chamando-os, inclusive, de oportunistas. Havia muitos manifestantes que defendiam a não participação de políticos naqueles protestos. Os movimentos, naquele momento, já tinham em grande parte outra identidade. No domingo anterior à nomeação de Lula como Ministro da Casa Civil, os movimentos de rua tinham levado três milhões de pessoas às ruas num protesto contra o governo e contra a possível nomeação do ex-presidente para um cargo ministerial. Não se ignora a voz de três milhões de pessoas impunemente. A nomeação dele para a casa civil soou, até para muitos que apoiavam o governo, como um desrespeito às vozes de uma parte significativa da população. Ao ignorar o movimento, o governo ajudou a jogar uma pá de cal sobre as possibilidades de superação da crise política em que se encontrava.

A realidade me esbofeteou pra valer mesmo naquela sessão de domingo da Câmara de Deputados que aprovou o prosseguimento do processo de impeachment da presidente. Olhava incrédula para a postura e ficava atônita com as falas de grande parte daqueles parlamentares. Pensava na gravidade do que aquilo significava para além daquele resultado, para o fato de que aqueles senhores e aquelas senhoras ocupavam cargos representativos e, portanto, representavam uma parcela da população. Suas condutas questionáveis naquele dia e nos dias que se seguiram àquela sessão colocavam em xeque o nosso congresso. Ética?! Decoro?! Nada disso parecia existir por ali. Passei, a partir daí, a olhar com mais atenção o número expressivo e crescente de votos em branco e nulos , bem como o enorme número de abstenções nos processos eleitorais para os mais diversos cargos políticos de nosso país. Nosso sistema eleitoral desconsidera esses números para os resultados, no entanto, diante do quantitativo de pessoas que representam, devíamos repensá-lo. Não basta criticar os que agem assim, tampouco rotulá-los de isentões. Tais votos também manifestam uma mensagem, a de que aqueles eleitores não concordam que nenhum dos candidatos inscritos os representem e isso é coisa à beça.  Para muitos, deixar de votar é uma decisão amadurecida e demasiadamente difícil. Jamais votei nulo ou em branco nem me abstive das votações, mas entendo quem o faz. É preciso pensar nisso com a seriedade que o assunto merece.

Depois de passar pela Câmara dos Deputados, o Senado brasileiro aprovou o impeachment, que  se consolidou como um golpe quando, dois dias depois de ser votado,  o mesmo Senado sancionou uma lei que flexibilizava as regras para a abertura dos créditos suplementares sem a necessidade de autorização pelo Congresso Nacional. A partir daquela data, então, estavam legalizadas as “pedaladas fiscais”, que foram o principal argumento para o pedido do impeachment presidencial. Ou seja, depuseram a presidente por uma ilegalidade que dois dias depois avaliaram como legal. Deram nó em pingo de éter bem na nossa frente. Ao contrário do que ocorrera no impeachment de Collor, a voz das ruas não era uníssona. Novamente havia sido desconsiderada uma parte significativa da população.

Pouco mais de um ano do ocorrido, o que temos visto é de abalar as estruturas das nossas esperanças. Temos um presidente que foi gravado em uma conversa comprometedora com o empresário e delator Joesley Batista  em que, o mínimo que se pode pensar, é que o presidente tenha prevaricado. Acusado pela Procuradoria Geral da União de crime de corrupção passiva, esse mesmo presidente, ao invés de tomar atitudes coerentes com a lisura e a transparência que o exercício de sua função exigem, toma providências no sentido de dificultar a visão da entrada do Palácio do Jaburu e estabelece o uso de mecanismos para dificultar a gravação de suas conversas, como é o caso da instalação  do misturador de vozes. Coisa que mais se aproxima de uma confissão de culpa do que do desejo de provar que não a tem. Sua manutenção na presidência tem se dado por manobras e mais manobras políticas que, se não forem ilegais, certamente são imorais. A crise econômica e financeira continua instalada. Houve perdas de direitos trabalhistas. Universidades públicas agonizando. O aumento do número de pessoas em situação de rua é visível. O aumento da violência e da criminalidade é sentido pela população até fora dos grandes centros. E ninguém se manifesta. Bem, isso é o que dizem. Tenho visto, pelo país afora, gritos e mais gritos de “Fora, Temer!” E esse coro está crescendo. Basta que haja uma reunião para que tal apelo surja naturalmente. Se os gritos não ganharam as ruas, não quer dizer que eles não existam, é importante que isso fique claro.

Por que os gritos não ganham as ruas? Há vários motivos, mas sobre dois deles eu gostaria de falar. Temos sido sistematicamente expostos ao medo. Medo de que a economia desande e que o país vá à bancarrota, como se o desacerto no campo econômico não estivesse intimamente ligado aos inúmeros processos de gestão fraudulenta, de rios e rios de propina de que nos dá conta o Ministério Público. É como se falassem para nós que os gestores não têm culpa, mas nós podemos pôr o país a perder por querer que o presidente responda o processo por corrupção passiva no Supremo Tribunal Federal. Há uma espécie de ameaça de que teremos responsabilidade pelo fracasso da economia se houver uma mudança. “Ruim com ele, pior sem ele”, nos avisam alguns a todo o tempo. Além disso, a pós-verdade, sem entrarmos na discussão filosófica se está sendo usada no sentido real ou equivocado do termo, mas pensando no significado que tem assumido no contexto atual, tem ajudado a nos confundir, valorizando mais a versão do fato do que o fato ocorrido em si. Dando mais crédito à versão do fato do que a verdade em si. Os discursos de alguns políticos são completa e propositada distorção dos fatos. Precisamos estar atentos a isso.  Temos o dever cívico de não nos deixar enganar. Concordar que um presidente não seja julgado por um crime do qual se tem provas é o mesmo que assegurar para toda a classe política que a lei não pode atingi-los.  É endossar a impunidade.  A população não foi para a rua? Há muitos meios de se manifestar, ir às ruas não é o único. É fundamental fazer uso deles.

E o que tem Caetano a ver com tudo isso? Passei boa parte da vida adulta vendo uma escalada crescente de conquistas e direitos, tenho estado dolorida vendo essas conquistas descendo ladeira a baixo. Constatar toda a fragilidade desses direitos tem sido um duro aprendizado. Olhar Caetano ali no palco, desfilando sua poesia ante meus olhos, lembrar que ele foi um preso político, que foi exilado; ouvir canções compostas em 1968; constatar as letras vivas e mordazes de algumas de suas canções e não pensar na situação atual do país, no estado de coisas que estamos vivendo, no avizinhamento de um tempo ainda mais sombrio é simplesmente impossível. É inevitável linkar o Brasil atual aos podres poderes de Caetano. Naquele show, a adulta dolorida que estou se encontrou com a jovem esperançosa que eu fui e ratificou minha convicção de que é preciso resistir. Resistir com amor, com poesia, com dança, com música, com garra, com arte, com beleza para manter a saúde emocional. Resistir fazendo uso dos meios disponíveis para me manifestar. Resistir buscando informações em muitas e muitas fontes para não ser catequizada pelos manipuladores da informação. Sim, quem se propõe a ouvir mais do mesmo o tempo todo, pode acabar com sua capacidade de análise comprometida.  É preciso ser um leitor plural, lendo e ouvindo aqueles que concordam conosco e também aqueles que discordam de nós. É preciso crescer e exercitar o respeito, prestar muita atenção aos fatos e lutar pelo que se acredita.

Enquanto boa parte da classe política do nosso país exerce seus podres poderes, estamos nos perdendo ao dividir nossas forças. Enquanto eles nos vencem, saqueiam e oprimem, nos desgastamos em confrontos nas ruas ou em redes sociais. A polarização tem facilitado muito a vida deles. Até quando nos conformaremos com ridículos tiranos?

PODRES PODERES
(Caetano Veloso)



SOBRE AS HERANÇAS DO PLANO COLLOR
http://istoe.com.br/58752_DIFICIL+DE+ESQUECER/

RESULTADO DAS ELEIÇÕES DIRETAS PARA A PRESIDÊNCIA DO BRASIL EM 2014
http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2014/Dezembro/plenario-do-tse-proclama-resultado-definitivo-do-segundo-turno-da-eleicao-presidencial

PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES PELO IMPEACHMENT DA PRESIDENTE
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2014-11-01/protesto-contra-dilma-rousseff-fecha-avenida-paulista.html

CONVOCAÇÃO PARA PROTESTOS FEITAS POR CANDIDATOS DA OPOSIÇÃO EM DEZEMBRO DE 2014
http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/12/aecio-e-oposicionistas-fazem-pela-web-convocacao-para-ato-de-protesto.html

SOBRE O DISCURSO DE HILLARY CLINTON
https://www.youtube.com/watch?v=1AJph8kHBYc#t=1154.821324

SOBRE AS MANIFESTAÇÕES POPULARES DE 13 DE MARÇO DE 2016
https://brasil.elpais.com/brasil/2016/03/13/politica/1457906776_440577.html

APROVAÇÃO DAS PEDALADAS FISCAIS PELO SENADO DOIS DIAS DEPOIS DO IMPEACHMENT
http://economia.ig.com.br/2016-09-02/lei-orcamento.html


OUTROS TEXTOS INTERESSANTES

Logo após o resultado das eleições
http://g1.globo.com/sao-paulo/eleicoes/2014/noticia/2014/10/na-paulista-tucanos-gritam-impeachment-e-petistas-pedem-choro-no-cantareira.html

De antes das eleições
http://congressoemfoco.uol.com.br/opiniao/colunistas/os-dilemas-da-atual-oposicao-a-presidente-dilma/